Review Metalinguístico: Opus

Prepare-se pra conhecer um mangá que se passa dentro de um mangá que se passa dento de um mangá…

Pareceu confuso? Mas acredite, Satoshi Kon sabia muito bem o que estava fazendo! Lançado em dois volumes pela Panini, Opus conta a história de  Chikara Nagai, um mangaká que criou uma hit de sucesso chamado Resonance. No entanto, o mangá foi perdendo popularidade através dos anos e Chikara é pressionado pela editora a dar um fim satisfatório a obra para encerrar a publicação. Como já estava meio exausto, Chikara decide matar um dos mais importantes coadjuvantes da trama, um menino chamado Lin, ao mesmo tempo em que ele mataria o  vilão, um ser misterioso chamado de o Máscara, durante um embate de poderes paranormais. Nada muito incomum, muitos mangás são terminados as pressas no Japão pela queda de popularidade ou mesmo por que o autor esticou demais a trama e já não sabia o que estava fazendo, vide Bleach. Porém, as coisas ficam realmente complicadas quando um sujeito não concorda em nada com esse final. E esse sujeito é ninguém mais, ninguém menos que…Lin, o personagem que morreria!

Satoshi Kon - Opus, meta

Afim de impedir sua morte, Lin arruma um jeito de vir ao mundo real e “sequestra” o original da página onde morreria, página essa que já estava com o prazo estourado para entrega à editora por parte de Chikara. No lugar da splash page com a morte de Lin e do Máscara, Chikara se depara com uma página que parece ter um túnel sem fim desenhando, e foi por ele que Lin veio até o mundo real…e é por ele que Chikara é sugado para o mundo de seu mangá. Lá, conhece pessoalmente a sua protagonista, a detetive com poderes paranormais, Satoko, a qual descobre, incrédula, quem é Chikara e não aceita muito bem o fato de seu mundo ser um mangá. Agora, ambos tem que caçar Lin que pretende não apenas impedir sua morte como voltar no tempo (leia-se “primeiros capítulos de Resonance”) e impedir o surgimento do Máscara. E é claro que o vilão não vai deixar barato e vai tentar não apenas impedir Lin como tomar o lugar de “Deus” daquele mundo das mãos de Chikara.

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Se você não conhece Satoshi Kon, eu o convido a conhece-lo URGENTEMENTE! Mais conhecido pelas animações que dirigiu do que pelos mangás que produziu, Kon tem em seu currículo obras MARAVILHOSAS, como o pesado  Perfect Blue, o psicodélico Paprika (lançado no Brasil), o emocionante Tokyo Godfathers (também lançado no Brasil) e o belíssimo Millenium Actress entre tantos outros.

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E caso você tenha assistido a qualquer uma das animações supracitadas, saiba que ler Opus é como ver um belíssimo storyboard de uma animação que nunca saiu! O traço de Kon é BELÍSSIMO, sua narrativa é FANTÁSTICA e seus personagens são EXTREMAMENTE CATIVANTES. E muito disso se deve aos seus trabalhos anteriores no campo da animação, pois Opus é de 1995 e os filmes que citei acima são todos posteriores. No entanto, Kon já havia trabalhado em outras produções como o OVA de Jojo’s Bizarre Adventures (1993), o OVA Roujin Z roteirizado por Katsuhio Otomo (de 1991 e que você pode conferir AQUI) e o segundo filme de Patlabor (1992) e é essa experiência que deixa o mangá com esse visual dinâmico e tão gostoso de se ler. Mas as vezes a vida imita a arte de forma cruel…

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ATENÇÃO: A PARTIR DAQUI HAVERÃO LEVES SPOILERS SOBRE O FINAL DO MANGÁ! ESTEJA AVISADO!

Iniciado em outubro de 1995 e encerrado em junho de 1996, Opus estava pra se tornar um trabalho paralelo de Satoshi Kon, pois ele estava envolvido com a pré-produção de Perfect Blue e isso lhe deixaria com prazos extremamente apertados. Foi quando o destino lançou uma solução um tanto cruel para esse dilema: certo dia, Kon recebeu uma ligação dos editores da Comic Guard, revista onde Opus era publicado, anunciando que a revista seria fechada e que Kon teria apenas mais 3 capítulos para finalizar Opus. O problema é que 3 capítulos não seriam o suficiente para fechar a história como Kon planejava. Como Kon já estava trabalhando a todo vapor em Perfect Blue e Opus havia começado como uma série experimental, ele preferiu deixar a publicação encerrar em aberto. Talvez o fato de não apenas a revista ser cancelada como isso impedir que Opus ganhasse uma edição encadernada tenha desanimado ainda mais Kon a dar um final a sua obra. No entanto, Kon havia começado a desenhar um final mais metalinguístico ainda para seu já metalinguístico mangá. Ele, de fato, finalizou este capítulo em forma de esboço mas nunca finalizou, de fato, as páginas. No entanto, os esboços de Kon eram muito melhores que muito trabalho finalizado de artista conceituado por aí…e, para a publicação original do mangá em 2011, um ano após o falecimento de Kon devido a um câncer e pâncreas, esse final foi anexado aos demais capítulos e fechou a obra até então inacabada do autor. As páginas estão a lápis e dão um final meio brusco e até meio maluco a história, o que pode gerar estranhamento e até um certo desgosto para muitos que esperavam um final mais explicativo e até convencional para a trama em si. Mas eu, particularmente, gostei bastante deste final, pois a obra inicialmente mostrava algumas das dificuldade de se produzir um mangá através da visão de Chikara, e o final mostrava as dificuldades através da visão do próprio Satoshi Kon, o que não apenas fechou a história como soou como um “Bem…isso é tudo, pessoal!” por parte de Kon. Pegar esse material e incluí-lo na sonhada versão encadernada de Kon, que ele jamais imaginou que sairia por não ter conseguido publicar este último capítulo é um belo tributo ao autor.

 FIM DOS LEVES SPOILERS!

O saldo final de Opus é extremamente positivo. Um dos melhores mangás curtos que li esse ano e, para minha alegria, na Japan Expo deste ano foi anunciado que uma adaptação em anime estaria planejado para breve. O responsável será Masao Maruyama, co-fundador da Madhouse e produtor de muitos dos filmes dirigidos por Satoshi Kon. No entanto, nada de concreto foi divulgado, resta torcer para que o projeto vá pra frente. Enquanto isso, resta ler e reler Opus e mergulhar novamente neste louco e divertido mundo criado por Kon, uma mente criativa que deixou um incrível legado para os fãs de quadrinhos e animações japonesas.

Nota: 10

OPUS
Volumes: 2
Preço: R$13,90 (sim, papel jornal)
Editora: Panini
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